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segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Como enfrentar o desafio do autoritarismo crescente

Frank Hoffer
Na atualidade, as más notícias parecem devastadoras: Duterte, Erdogan, Jinping, Kaczynski, Modi, Orban, Putin, Trump. A lista dos líderes políticos fracassados, que apesar de tudo mantêm seu apoio popular, cresce dia a dia; líderes que não fracassam em termos de maximização de seu poder pessoal, mas na hora de tratar das necessidades e do futuro do povo. Líderes machistas unidos pela simpatia pelo nacionalismo autoritário e pela falta de respeito pela democracia, pela justiça e pelos valores humanistas globais estão em ascensão. Assistimos a um movimento tectônico global em direção ao nacionalismo, ao chauvinismo masculino, ao ódio contra as minorias e ao enriquecimento plutocrático. A situação é difícil e ficar ainda pior.

A defesa medíocre da situação atual pelas forças ecologistas, liberais e de esquerda não contribuirá em nada para deter o avanço da ultradireita. O espírito da época exige mudança. As obsessões pseudorradicais com a linguagem purificada e correta, ou a luta apaixonada contra expressões não intencionais, e às vezes subconscientes de representantes da corrente majoritária que são apresentadas como microagressões contra grupos minoritários, não captam o que realmente está em jogo.

Para inverter a maré é necessária uma visão de justiça nos níveis local e global que sensibilize as pessoas além das universidades e das zonas de conforto urbana em vias de gentrificação. Ao mesmo tempo, exige trabalhar para conseguir mudanças fundamentais e realizar esforços diários para tornar a vida mais suportável em um mundo muitas vezes temerário e injusto.


Será mais fácil entender a importância de manter o vínculo entre a mudança imediata e a visão de longo prazo se olharmos para o passado. Gostaria de explicar isso comparando dois movimentos do século XX que propugnaram mudanças revolucionárias: o feminismo e o socialismo.

No ano passado a Revolução Russa fez cem anos. Dois revolucionários russos inteligentes, apaixonados e carismáticos, conhecidos geralmente como Trotsky e Lenin, substituíram a ortodoxia marxista do materialismo histórico pelo voluntarismo revolucionário e consolidaram o descontentamento anticzarista das massas sob a forma de uma ditadura de partido único para construir um futuro socialista. A Revolução de Outubro repercutiu em milhões de pessoas de todo o mundo. A parte mais radical do movimento operário internacional correu em sua defesa, sacrificando suas convicções e princípios e a ideia do socialismo democrático; muitos, inclusive, deram sua vida para defender o baluarte do antifascismo e do anticapitalismo.

No entanto, em retrospectiva, devemos reconhecer que a ‘Grande Revolução de Outubro’ fracassou. O poder utópico da ideia socialista não sobreviveu à realidade deprimente do terror estalinista, da coletivização forçada, da ineficiência econômica, da degradação ambiental e, finalmente, do estagnação gerontocrática. Hoje, a chama da Revolução de Outubro perdeu sua imaginação e, por enquanto, não há indícios de que possa recuperá-la.

A revolução cultural e social feminista
Que comparação seria possível entre essa revolução e o outro movimento de massas que induziu as mudanças mais fundamentais dos últimos cem anos, o feminismo? No início do século XX, as mulheres não tinham direito de votar ou de tomar decisões de negócios independentes, além de serem excluídas da educação superior e do esporte. Quase todos os cargos de direção e os empregos de maior prestígio, como advogado, médico, professor universitário, entre outros, estavam reservados para os homens. Raramente o abuso sexual era objeto de debate, o aborto era tratado como um crime, e as feministas vistas como o equivalente moderno das bruxas medievais. Em muitos países persistem as mais diversas formas de discriminação de gênero, embora seja provável que os futuros historiadores se lembrem dos últimos 100 anos pelas mudanças mais radicais nas relações de gênero da história da humanidade.

Em uma revolução permanente de mudanças progressivas, não há um momento revolucionário específico de mudança de regime; seus efeitos básicos só são distinguidos a posteriori. A mudança fundamental é o resultado de um processo contínuo de transformação e, nesse processo, o progresso é uma possibilidade constante, ainda que nunca assegurada. É a soma de mudanças pequenas e nem tão pequenas que, com o tempo, acarretam uma transformação qualitativa.

Por que escolhi o movimento das mulheres em vez da social-democracia como a imagem que reflete o fracasso da transformação através da tomada revolucionária do poder? A decadência da social-democracia é um fenômeno quase universal que não pode ser explicado pelo fracasso de determinados líderes específicos ou pela situação particular de um país. Há várias razões. A implosão da União Soviética e o surgimento da globalização mudaram o equilíbrio de poder nas sociedades. A mobilidade do capital global e a capacidade de realocar a produção industrial sem dificuldades mudaram o equilíbrio a favor do capital. À medida que o capital se liberou das restrições nacionais, e inclusive da obrigação de pagar impostos, as políticas de redistribuição ficaram limitadas, cada vez mais, ao ‘socialismo em uma classe’; em outras palavras, os fundos para as políticas sociais devem provir dos impostos pagos pela ampla classe média. Mas uma parte considerável dessa classe média tornou-se hostil às políticas de redistribuição, especialmente porque os ricos evadem sistematicamente suas obrigações tributárias e usam seu poder econômico para aumentar as medidas de bem-estar empresarial.

No novo mundo dos mercados desintegrados, as tentativas da social-democracia de convencer o capital entraram por um ouvido e saíram pelo outro. Depois das derrotas eleitorais da década de 70 e do triunfo do Ocidente na Guerra Fria, a social-democracia escolheu ficar do seu lado, já que não tinha condições de vencê-los. Ao aceitar a liberação do capital pela globalização como condição inevitável da modernização, tornou-se refém de uma lógica que contradiz seus valores.

A modernização tecnocrática não capta a imaginação
A social-democracia abriu mão de qualquer visão apaixonada de mudança real e reduziu sua percepção democrática de justiça social à educação e o desenvolvimento de destrezas como o caminho individual para alcançá-la.

Parece que o movimento operário se enganou e o feminismo acertou ao lutar por uma maior igualdade de gênero em muitas frentes, tais como o acesso à educação, a linguagem neutra, a redução das diferenças salariais por gênero, a exigência de igualdade da categoria legal, a luta contra a violência sexual, a exigência de cotas de gênero e a insistência nas ações positivas, sem perder de vista o programa radical de transformação das relações de gênero em toda a sociedade. Enquanto o movimento operário se dividiu em dois campos opostos, o reformista e o revolucionário, o feminismo parece ter sido capaz de manter a unidade global por cima de expressões muito divergentes. #MeToo é a última demonstração dessa capacidade de mobilização unida. Assim como o feminismo perderia seu poder de imaginar utopias se reconhecesse o predomínio masculino, a esquerda não pode prosperar enquanto não aceitar a primazia do mercado sobre a vontade política do povo.

As restrições estruturais do capitalismo global são uma realidade que a retórica anticapitalista não pode fazer desaparecer. No entanto, existe uma diferença fundamental entre abraçar essas restrições como inevitáveis e resistir à subordinação do povo à férrea lógica do mercado. É impossível imaginar uma política de esquerda sem que os mercados sejam transformados de patrões a servidores da sociedade.

Simplesmente não é verdade que não existe um espaço político necessário para conseguir mudanças. Não é verdade que seja impossível recorrer à legislação nacional e internacional para governar o mercado. Não é verdade que não existam alternativas à mobilidade irrestrita do capital. Não é verdade que seja impossível enfrentar a evasão fiscal. Não será fácil, mas isso não é o mesmo que impossível. Sempre existem alternativas, mas quando as progressistas não estão disponíveis, opta-se pelas reacionárias. Hoje assistimos a este processo; o povo está votando contra um sistema que não lhe dá respostas.

O vácuo duplo da esquerda é uma razão importante da virada para a direita. A tomada revolucionária do poder desapareceu quase completamente ou continua existindo em termos de uma retórica nostálgica dirigida exclusivamente aos que já se converteram. A social-democracia reorientou-se da mudança progressiva com visão transformadora para a reparação e a manutenção do regime existente e abriu mão, em grande parte, de ter qualquer visão ardente de mudança real.

Nesse contexto, a ultradireita consegue construir um relato que chega a muitas pessoas porque, de certa forma, combina a antiglobalização, a justiça, o racismo, a identidade, a avareza corporativa, a franqueza, a tradição, os valores familiares, a islamofobia e a lei e a ordem. Em poucas palavras, sua mensagem pode ser resumida em um slogan: ‘Frustrados do mundo, unam-se contra aqueles que são mais fracos e pobres que vocês!’ Desse modo, o descontentamento multidimensional é canalizado em direção da mobilização dos supremacistas insatisfeitos para manter e, em parte, restaurar um mundo que ressoe com sua zona de conforto cultural. ‘Ame o país ou deixe-o’ seria a versão sucinta da concepção limitada da política baseada na identidade das maiorias de outrora. A homogeneidade cultural triunfa sobre a desigualdade económica.

Podemos conseguir se queremos de verdade
Em face desta realidade, a esquerda deve desenvolver um relato alternativo que aponte à inclusão, e não à exclusão, e mobilize as sociedades a favor das mudanças que as liberem da camisa de força estrutural da globalização desenfreada. É preciso imaginar esse futuro melhor como algo que pode ser alcançado ou, para expressá-lo em linguagem popular: ‘Podemos conseguir se queremos de verdade.’

Para isso, são necessárias visões inspiradoras perseguidas por meio de um radicalismo progressivo. O desafio está em criar uma unidade pluralista baseada na interpretação de nossas sociedades através do prisma da justiça social, da liberdade, da possibilidade de escolha, da tolerância e do respeito. Trata-se de conectar os desejos –diferentes e ao mesmo tempo compatíveis– de uma vida melhor para poder transladá-los a políticas práticas em favor das mudanças positivas. A limitação da globalização, a recuperação da capacidade de tributar aos ricos, a democratização de nossas sociedades e economias, e a transformação de nossas organizações em exemplos de uma democracia genuína com igualdade e participação constituem desafios enormes, embora não fora do alcance do possível.

Sonhadores ditatoriais e realistas cautelosos fracassaram igualmente diante desses desafios. A paixão e a razão são dois ingredientes indispensáveis para todos os movimentos progressistas. A razão fria tende a desembocar na modernização tecnocrática, enquanto a paixão pura acaba na intolerância autoritária. A arte do verdadeiro radical consiste em atingir um equilíbrio justo.

Baixe este artigo em PDF

Frank Hoffer trabalha como professor associado da Global Labour University.

As opiniões expressas nesta publicação não necessariamente refletem as da Fundação Friedrich Ebert.

Posted in: Autoritarismo,Feminismo,Social-Democracia
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